quinta-feira, 11 de abril de 2013

Resenha: A Resposta e o Vento - Ricardo Thomé


Sinopse: Um fragmento de uma frase – “Nunca é tarde para ser” – , supostamente de autoria da novelista inglesa George Eliot, colado em um pedaço de cartolina, vai sendo levado pelo vento através das ruas de Copacabana. Cada um que o encontra (ou que é encontrado por ele) vai experimentando uma transformação causada por aquelas palavras. São personagens que, sem se conhecerem, apresentam em comum o fato de terem todos participado, de uma forma ou de outra, de uma tragédia ocorrida sete anos antes: o assassinato de um jovem dentro de um coletivo, em Botafogo. O fragmento da frase e o vento vão costurando, sutilmente, estas trajetórias, até o desfecho imprevisível e surpreendente.
Nunca é tarde para ser.  

Desmascarando os esteriótipos brasileiros, Ricardo Thomé cria histórias que se interligam de uma maneira bastante inusitada: ambas as personagens encontram o mesmo pedaço de papel e ambas as personagens tiveram o momento de mais medo e tensão da vida juntas num passado não muito passado.

''Inúmeros são os sinais e incontáveis as maneiras através das quais a natureza se comunica conosco. Com todos nós. Nós pedras, nós grãos de areia, nós insetos. Com todos nós. Nós capim, nós arbustos, nós répteis. Todos nós: nuvens, átomos, minérios, peixes, cães, gatos; com todos  nós, homens e mulheres, brancos e negros, jovens e idosos. E, possivelmente, numa outra instância até com nós mortos. Ou, numa inversão do que se acabou de dizer, até nós, mortos, nos comunicamos constantemente com a natureza, por incontáveis maneiras, através de inúmeros sinais.
Por exemplo: ouçam, agora, o que nos diz este vento que passa. Prestem atenção no que eles nos traz, no que ele leva para longe de nós, nas pequenas ou grandes transformações que ele está operando em nossas vidas e nos elementos que estão em torno de cada um de nós. Observem, sobretudo, que ele passa por nós, para nós, e não do outro lado do planeta, para as coisas, bichos, elementos e pessoas de lá. É para nós que ele sopra, é para nós que ele está falando. Bem aqui, em Copacabana, Rio de Janeiro, Brasil. Ouça-mo-lo.'' Pág. 14. 

Não vou me ater aos nomes das personagens pois os contos são muito curtos e gravar nomes não é a intenção (pelo menos não foi a minha) na leitura. Conhecemos uma velha que não recebe visitantes há 17 anos, e tem como sua única companheira uma gata deixada por sua amiga que morreu há algum tempo e tem como único amigo um objeto bastante peculiar que ela apelida de ''Zezinho''. Ela reflete e reflete e chega a conclusão de que vai ser doloroso viver sem sua única companheira, mas e se ela morrer antes da gata? ela também é considerada companheira pelo animal?

Conhecemos também a ''Casa dos Renegados'' que é chamado um apartamento onde vivem dois gays, um travesti e um cachorro. Eles lutam diariamente para encontrar um lugar na sociedade e seu lugar no seu próprio mundinho. Um meio de levar a vida seria a prostituição? enfrentam uma cirurgia perigosa para descobrir-se vale a pena?

Vemos um resenhista-poeta que vive angustiadamente por ver sua mulher fraca e depressiva em cima de uma cama por estar fraca de tanto se cortar e de tanto tentar tirar sua vida de várias maneiras. Não vendo mais razão para viver, refletimos junto com o casal e seu pássaro o quanto vale a pena lutar por viver onde não queremos ou como não queremos.

Como vocês perceberam, pessoas solitárias (literalmente ou não) é algo que não falta nesse livro... Uma gordinha que foi abusada sexualmente quando era criança e que agora é viciada em sexo virtual, tentando encontrar onde segurar-se numa sociedade em que o diâmetro da cintura ou a textura da pele facial vale mais do que ações. Como disse no início, as personagens já haviam se encontrado em um momento crítico do passado e vemos que a ''gordinha viciada em sexo virtual'' foi a mais prejudicada por tudo isso.

E por fim, mas não menos importante, conhecemos a vida de um bêbado. Aliás, o que conhecemos é a única coisa que ele pretende mudar na vida, deixar no passado, apagar da memória. Cansado de ser visto como um alcoólatra analfabeto, ele ao encontrar um pedaço de papel e depois de muito sacrifício conseguir lê-lo, consegue enxergar nas palavras: ''Nunca é tarde para ser'' uma válvula de escape a um fim de vida menos miserável.

É nesse contexto meio auto-ajuda, critica social, sexual e cheio de polêmicas que conseguimos enxergar o quão os rótulos nos são desnecessários e importante ao mesmo tempo. Ricardo Thomé tem um humor bastante ácido e não perde tempo em expressar ironias em forma de personagens. É uma leitura muito boa, imperdível. É uma releitura dos males sociais, do lixo que é a sociedade em que nos encontramos e do lixo que enchem nossas cabeças. Com questões filosóficas, morais, sociais, estéticas e conservadoras. Recomendo! 5 estrelas.

2 comentários:

  1. O livro me pareceu bem interessante, pretendo ler em breve! E a resenha ficou ótima.

    Beijos,
    Carol - http://hconcours.blogspot.com.br/

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  2. Que bom, Allison, ouvir o que os outros acham daquilo que a gente escreveu. E a gente escreve, é claro, para ser lido. Achei muito inteligente a sua crítica, muito interessante a leitura que você fez deste meu "A resposta e o vento". Valeu, mesmo!
    Ricardo Thomé

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